terça-feira, novembro 06, 2007

Crise na Europa

2007-10-26 – Ciência Hoje

A Europa é incapaz de voltar a produzir "Platões, Mozarts ou Bachs" - afirma George Steiner
O crítico e ensaísta George Steiner considera que a Europa está a atravessar uma crise cultural tão profunda que será incapaz de voltar a produzir "Platões, Mozarts ou Bachs", que aparecerão noutros locais do planeta, como a Índia ou a China.
"A Europa está muito, muito cansada. Quando a crise do Kosovo começou a Europa teve de ir a correr para a América a pedir ajuda e a América teve de vir outra vez resolver esta pequena crise, porque nem teve vontade política de varrer a sua própria sujidade", disse Steiner à margem da conferência "A Ciência terá limites?", que ontem começou na Fundação Calouste Gulbenkian.
"Não faz mal, tivemos dois mil anos interessantes e ninguém prometeu que isto durava para sempre", referiu Steiner, considerando que a Europa está em tão mau estado que ninguém pode estar optimista. Mas "outras civilizações irão ocupar o seu lugar e para os mais novos irá ser muito excitante", ressalvou. O ensaísta realçou que as igrejas vazias "são um símbolo do fim do cristianismo clássico" numa Europa que enfrenta hoje uma grande crise de esperança. "Desde a revolução francesa que a esperança tem estado sempre à esquerda. Mas hoje não há mais esquerda na Europa. O que os jovens vão querer? Vão querer dinheiro! A Europa actualmente é o cheiro do dinheiro, que é tão sufocante e pode vir a ser um grande Macau ou uma explosão enorme", afirma. A crise na cultura, por outro lado, levará a uma crise na ciência. "A seguir à religião algo virá, porque as pessoas têm dificuldade em viver na solidão, mas o que me assusta é que deste vazio saia o que é ´kitch`, ou o futebol", que considerou a actual grande religião. "Maradona substituiu Pascal", referiu. Com esta crise, disse Steiner, "não haverá mais Platões, nem mais Mozarts ou Bachs na Europa". "Eles vão aparecer na Índia ou noutros locais do planeta, mas não na Europa. É a vez deles", considerou. "Vou dizer uma coisa que vai deixar zangada muita gente: uma civilização que mata os seus judeus não recupera", disse ainda Steiner. Para o ensaísta, a chave para combater este quadro em que "a irracionalidade, a astrologia, o lixo 'new age' estão a flutuar nas nossas vidas", é o Ensino. "Até a nossa sociedade mudar e apoiar os professores, nada de bom acontecerá", salientou. A conferência "A Ciência terá limites?" termina hoje na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, com a participação de conceituados cientistas das mais diversas áreas e nacionalidades. Além do ensaísta George Steiner, estão presentes os professores e cientistas Dieter Lüst, Peter Woit, Gerald Edelman, Wolf Singer, Luís Alvarez-Gaumé, Lewis Wolpert, Helga Nowotny, Eörs Szathmáry, John Horgan, Freeman Dyson, Laura Bossi e Jean-Pierre Luminet, com sessões presididas pelos cientistas nacionais Gustavo Castelo Branco, Luís Moniz Pereira, João Ferreira de Almeida, Maria do Carmo Fonseca, António Coutinho e João Caraça.
George Steiner
Natural de Paris (1929), George Steiner radica-se nos Estados Unidos em 1940. Nos anos cinquenta foi membro da equipa editorial do The Economist em Londres, iniciando a sua carreira académica mais tarde, em 1956, no Instituto de Estudos Avançados da Universidade de Princeton. Desde então, Steiner tem leccionado em diversas universidades como a de Yale, Oxford, New York e Genève. Hoje ensina nas Universidades de Oxford, Harvard e Cambridge.

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